- Estávamos falando de coisas que nos interessam muitíssimo – disse ela. – Não seria bom continuarmos, e deixar Swift para outra ocasião? Não me sinto com disposição para Swift, e é pena ler alguém nesse estado de espírito, sobretudo Swift.
A Pretensão de douta especulação literária, como imaginara, restaurou a confiança de William em sua segurança pessoal, e ele pôs o livro de volta na estante, mantendo-se de costas para ela ao fazê-lo e aproveitando a oportunidade para concatenar seus pensamentos. Mas um segundo de introspecção tivera por alarmante resultado mostrar-lhe que sua própria mente, quando vista de fora para dentro, já não era um terreno familiar. Ou seja, o que sentira antes, conscientemente. Revelou-se a si mesmo como pessoa diversa da que gostaria de ser, viu-se ao léu num mar de possibilidades tulmutuosas e desconhecidas. Ficou a andar de um lado para o outro da sala, depois atirou-se impetuosamente na cadeira ao lado da ocupada por Katharine. Nunca antes sentira coisa alguma parecida com isso. Colocou-se inteiramente nas mãos dela. Abandonou toda e qualquer responsabilidade. E quase exclamou em voz alta:
“Você despertou todas essas odiosas e violentas emoções; agora tem que fazer o melhor que puder com elas.”
Contudo, sua presença junto dele surtiu um efeito calmante e tranqüilizador sobre sua agitação; ele se sentia apenas cônscio com ela, que ela o tiraria do beco-sem-saída, descobriria o que ele desejava e o obteria para ele.
- Quero fazer o que você me disser que faça – disse. – Coloco-me inteiramente nas suas mãos, Katharine.
- Você precisa tentar dizer-me o que sente – respondeu ela.
- Minha querida, sinto mil coisas a cada segundo que passa. Não estou certo de que não sei o que sinto. Aquela tarde na charneca... Foi lá, e então... – interrompeu-se. Não lhe disse o que acontecera. – Seu odioso bom senso, como sempre, convenceu-me por algum tempo, mas a verdade é que... só os Céus são capazes de dizer! – exclamou.
- Não é verdade que você está ou poderá estar apaixonado por Cassandra?
William curvou a cabeça. Depois de um momento de silêncio, murmurou:
- Creio que você tenha razão, Katharine.
Ela suspirou involuntariamente. Esperara o tempo todo, com uma intensidade que aumentava de segundo para segundo contra a corrente das palavras dele, que ao fim não chegaria a isso. Depois de um momento de surpreendente angústia, reuniu toda a sua coragem para dizer-lhe que só desejava pode ajudá-lo. E formulara as primeiras palavras de seus discurso quando soou uma batida na porta, terrível e assustadora para pessoas na condição de esgotamento nervoso em que estavam.
- Katharine, eu a venero – disse William, quase num sussurro.
- Sim – replicou ela, encolhendo-se com um pequeno calafrio -, mas você tem de abrir a porta.
Virgínia Woolf
Noite & Dia
Nova Fronteira – págs 249-250
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