sexta-feira, janeiro 25, 2008

A Musa

acordei às 6 da manhã
Adília Lopes contorcia-se na cama
ao meu lado
os lençóis presos aos pés
ao cabelo
Adília Lopes resolveu que eu precisava mesmo
era de uma musa
e sabia a musa
eu precisava
de uma Clarisse
beijei-lhe a face
ela adormeceu instantaneamente
com os lençóis agarrados aos meus cabelos

*

acordei 3 quilos mais leve
Clarisse vestia o amarelo
dos lençóis de elástico
do quarto de hóspedes
Clarisse era livre
e sonhava ferozmente
que ainda seria livre
Clarisse tinha verdadeira
obsessão
por rasgar papéis cheios de letras
e queimar minhas cartas
Clarisse disse-me um dia
que nunca me amara
Clarisse delirava
achava que existia o tempo
(e que ela mesma
se utilizava desse tempo
para alguma coisa)
Clarisse desconfiava
estava totalmente obcecada
e certa

*

perguntei à Adília
se a musa dela
comia seus sutiãs
e queimava suas cartas
Adília respondeu
musas só mudam a agência
e o número da conta

*

não se sentido bem
minha musa engoliu
de uma só vez
o caderno com os telefones de todos os homeopatas
Clarisse acha imperfeitos
os telefones
e os homeopatas
(afirmou que a alopatia funciona bem
mais contra os males de um mundo sem idéias)

Bárbara Nunes (2003)

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